O procurador-geral do Estado adjunto José Duarte Santana, afirmou, nesta terça, que está confiante no arquivamento do processo que apura direcionamento para contratação da Casa da Ribeira para elaboração e implementação do Plano Museológico e Expográfico no Complexo Cultural do Museu da Rampa, em Natal , e afirma que o Estado está convicto de que não houve nenhum tipo de direcionamento, ao contrário do que sustenta o Ministério Público. “O Estado tem certeza de que não houve direcionamento no contrato com a Casa da Ribeira. Há uma prerrogativa no Executivo e na Lei de Licitações que é a dispensa ou inexigibilidade. No caso, escolheu-se, por inexigibilidade, a Casa da Ribeira”, comenta.
“No final esse processo será arquivado, tendo em vista que não ficou caracterizado e não ficará [o direcionamento]. Realmente, a empresa preenchia, tinha os requisitos de expertise para a instalação do museu e foi vencedora, no sentido de que ela foi escolhida. Na licitação a empresa é vencedora, mas pela inexigibilidade você escolhe aquela empresa que preenche os requisitos”, acrescentou o procurador do Estado adjunto José Duarte Santana.
O Ministério Público, por sua vez, quer a rescisão do contrato, de R$ 126 mil, firmado entre o Governo do Estado e a Casa da Ribeira. A posição foi reafirmada pelo promotor da 60ª Promotoria de Justiça de Natal, Afonso de Ligório, durante audiência pública na sede do MP, na manhã da terça-feira (14). Ligório considera como positiva a decisão do governo em suspender o contrato, mas entende que o processo precisa ser refeito.
“O que nós estamos querendo efetivamente é o que está recomendado, tenho que me pautar pelos documentos que estão no processo. A gente quer a rescisão do contrato e quer que o Estado refaça os atos com participação ampla, até porque eu não sei se o projeto, que a Casa da Ribeira apresentou para o Museu da Rampa, atende as aspirações históricas, culturais, antropológicas, geográficas do Rio Grande do Norte, das gerações anteriores, do pessoal que vivenciou a 2ª Guerra Mundial”, ressalta o promotor Afonso de Ligório.
Com a assinatura do contrato, intermediado pela Secretaria de Estado de Turismo (Setur), a Casa da Ribeira ficou autorizada a captar recursos para executar os planos expográfico e museológico. Ao todo, essa captação de recursos seria de cerca de R$ 7 milhões para a implementação definitiva do Museu da Rampa, com a instalação de salas lúdicas, telões, contêineres educativos, acervos fotográficos, exposições, entre outros equipamentos ligados a participação do Rio Grande do Norte na 2ª Guerra Mundial e a história da aviação.
Esses recursos – que até a suspensão do contrato estavam sendo captados pela Casa da Ribeira – são oriundos do Programa Estadual Câmara Cascudo por meio de renúncia fiscal, isto é, o Governo do Estado deixa de arrecadar parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de empresas parceiras e destina o valor correspondente à contribuição para o investimento em projetos culturais. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE questionou o Governo do Estado sobre a quantidade já arrecadada para o projeto, mas não houve resposta até o fechamento desta edição.
Paralelamente ao inquérito civil do MP, o governo também montou uma auditoria para verificar o contrato. De um lado, o órgão fiscalizador contesta a contratação sem licitação da Casa da Ribeira, que não teria expertise para implementação do projeto. Do outro, o Governo argumenta que a Casa da Ribeira é dotada da especialização necessária para montar o Museu da Rampa, com base na elaboração de projetos semelhantes, o que justificaria a escolha sem processo licitatório. Crispiniano Neto, presidente da Fundação José Augusto (FJA), cita a exposição Câmara Cascudo, produzida pela Casa da Ribeira e apresentada no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, como um exemplo de competência da entidade.
A Casa da Ribeira informou que não irá se pronunciar sobre o assunto porque ainda não foi notificada oficialmente sobre a suspensão do acordo com o Governo do Rio Grande do Norte.
Com a suspensão do contrato, a gestão do Complexo da Rampa passou para a Fundação José Augusto, que já administra teatros, bibliotecas, museus, escolas de arte, corais e outros equipamentos pelo Estado. “O governo achou por bem passar a gestão do espaço da Rampa para a Fundação José Augusto enquanto se faz uma auditoria, dependendo do resultado e até da disponibilidade da Secretaria de Turismo em voltar a administrar, voltará ao controle dela, se acharem por bem que pode ficar mesmo com a Fundação, que tem também esse know-how, porque é natural a gente administrar museus”, declara Crispiniano Neto, presidente da FJA.
Investigação
De acordo com o promotor do Patrimônio Público, Afonso de Ligório, um dos pontos cruciais da investigação recai sobre uma suposta assinatura falsa no memorando que define a Casa da Ribeira como entidade dotada de notoriedade para o objeto de contratação. Ligório tem esse entendimento porque é justamente essa assinatura que dá início a todo o processo. A assinatura, de acordo com o MP, seria digital e da coordenadora de Articulação e Ordenamento da Secretaria de Turismo. Porém, a servidora alega que não foi ela quem assinou e que não conhece a Casa da Ribeira.
“Ela disse que não assinou, que não conhece essa contratação, não conhece a empresa contratada e jamais poderia afirmar aquilo que consta no documento. Até esse momento nós não sabemos de quem é a autoria desse ato administrativo, que é o ato que inaugura o processo. O MP vai ter que dar uma resposta a isso e qual a resposta de se apurar falsificações? Tem que ter um procedimento criminal que apure de quem é essa assinatura. Parafraseando o título de um livro: nós estamos com um documento à procura de um autor”, pontua Ligório.
Sobre a assinatura, o representante do Estado, procurador geral adjunto José Duarte Santana, diz que “não tem conhecimento do assunto”, mas reforça a necessidade de investigação. “Eu não participei dessa sessão, mas se houve falsidade, isso tem que ser apurado, mas hoje em dia tudo é eletrônico. Eu, por exemplo, tenho meu perfil e minha senha e a minha assessora pode fazer o documento e depois eu assinar. Antes de concluir o inquérito, não se pode fazer julgamentos, só depois de apurado é que se vai fazer o relatório para dizer se houve culpado ou não”, contrapõe.
A investigação do Ministério Público foi aberta no dia 8 de junho e seguirá por 30 dias. O inquérito civil está na fase de levantar os valores já captados pela Casa da Ribeira, conta o promotor Afonso. “Já tinha sido autorizada a captação de recursos, uma parte deles, estavam sendo captados paulatinamente. Ainda não sei em que medida, mas parte desses recursos já foram efetivamente usados”, destaca.
“Esse segundo momento agora é para que façamos a auditoria dos valores. Os valores do plano de trabalho, e isso foi colocado na recomendação, são sempre valores cheios. Chamou a atenção do MP que todos os itens que constavam lá eram valores fechados, de R$ 100 mil, R$ 30 mil, R$ 2,8 mil, isso tem que ser checado. Todos os valores são sempre cheios, é uma estimativa? Mas foi a prova da captação naqueles termos, não houve glosa”, explica.